aprendendo

31 março 2016

PELA LEGALIDADE, Wagner Moura

PELA LEGALIDADE,
Wagner Moura
Folha de S Paulo

Ser legalista não é o mesmo que ser governista, ser governista não é o mesmo que ser corrupto. É intelectualmente desonesto dizer que os governistas ou os simplesmente contrários ao impeachment são a favor da corrupção.

Embora me espante o ódio cego por um governo que tirou milhões de brasileiros da miséria e deu oportunidades nunca antes vistas para os pobres do país, não nego, em nome dessas conquistas, as evidências de que o PT montou um projeto de poder amparado por um esquema de corrupção. Isso precisa ser investigado de maneira democrática e imparcial.

Tenho feito inúmeras críticas públicas ao governo nos últimos 5 anos. O Brasil vive uma recessão que ameaça todas as conquistas recentes. A economia parou e não há mais dinheiro para bancar, entre outras coisas, as políticas sociais que mudaram a cara do país. Ninguém é mais responsável por esse cenário do que o próprio governo.

O esfacelamento das ideias progressistas, que tradicionalmente gravitam ao redor de um partido de esquerda, é também reflexo da decadência moral do PT, assim como a popularidade crescente de políticos fascistas como Jair Bolsonaro.

É possível que a esquerda pague por isso nas urnas das próximas eleições. Caso aconteça, irei lamentar, mas será democrático. O que está em andamento no Brasil hoje, no entanto, é uma tentativa revanchista de antecipar 2018 e derrubar na marra, via Judiciário politizado, um governo eleito por 54 milhões de votos. Um golpe clássico.

O país vive um Estado policialesco movido por ódio político. Sergio Moro é um juiz que age como promotor. As investigações evidenciam atropelos aos direitos consagrados da privacidade e da presunção de inocência. São prisões midiáticas, condenações prévias, linchamentos públicos, interceptações telefônicas questionáveis e vazamentos de informações seletivas para uma imprensa controlada por cinco famílias que nunca toleraram a ascensão de Lula.

Você que, como eu, gostaria que a corrupção fosse investigada e políticos corruptos fossem para a cadeia não pode se render a esse vale-tudo típico dos Estados totalitários. Isso é combater um erro com outro. Em nome da moralidade, barbaridades foram cometidas por governos de direita e de esquerda. A luta contra a corrupção foi também o mote usado pelos que apoiaram o golpe em 1964.

Arrepio-me sempre que escuto alguém dizer que precisamos “limpar” o Brasil. A ideia estúpida de que, “limpando” o país de um partido político, a corrupção acabará remete-me a outras faxinas horrendas que aconteceram ao longo da história do mundo. Em comum, o fato de todos os higienizadores se considerarem acima da lei por fazerem parte de uma “nobre cruzada pela moralidade”.

Você que, por ser contra a corrupção, quer um país governado por Michel Temer deve saber que o processo de impeachment foi aceito por conta das chamadas pedaladas fiscais, e não pelo escândalo da Petrobras. Um impeachment sem crime de responsabilidade provado contra a presidente é inconstitucional.

O nome de Dilma Rousseff não consta na lista, agora sigilosa, da Odebrecht, ao contrário dos de muitos que querem seu afastamento. Um pedido de impeachment aceito por um político como Eduardo Cunha, que o fez não por dever de consciência, mas por puro revide político, é teatro do absurdo.

O fato de o ministro do STF Gilmar Mendes promover em Lisboa um seminário com lideranças oposicionistas, como os senadores Aécio Neves e José Serra, é, no mínimo, estranho. A foto do juiz Moro com o tucano João Doria em evento empresarial é, no mínimo, inapropriada.

E se você também achar que há algo de tendencioso no reino das investigações, não significa que você necessariamente seja governista, muito menos apoiador de corruptos. Embora a TV não mostre, há muitos fazendo as mesmas perguntas que você.

23 março 2016

Os ratos e dono da casa

Numa vila morava um homem que construíra uma casa após uma longa luta com os loteadores locais. Com o tempo percebeu que a região toda estava infestada de ratos, inclusive sua casa. O loteador que lhe cedeu o terreno para a casa aconselhou-lhe que ateasse fogo aos ratos. O homem simples achou que isso poderia queimar-lhe a casa toda, mas como os ratos não saiam nem com veneno, seguiu o conselho do loteador, aparentemente mais sábio, formado em faculdade, vestia-se melhor, tinha reputação junto a comunidade e com a imprensa local, que vivia alardeando suas benfeitorias. Não deu outra, senão queimar a casa toda. Perdeu o controle do fogo e danou-se.
Como não viu outro jeito, acabou cedendo às pressões do loteador, que locava casas, para que lhe alugasse uma casa e morasse lá provisoriamente até que pudesse reconquistar um espaço novamente. Vendeu o terreno e entregou ao loteador como garantia dos aluguéis. Afinal de contas era a regra do locador.
Passado um tempo percebeu que a casa alugada, também tinha ratos. Procurou o locador e reclamou. Disse que atearia fogo como tinha feito em sua própria casa a conselho do próprio locador. Entretanto o locador lhe disse para não fazer isso, pois a casa já não era dele. Ratos tinha por todo canto na vila e isso não acabaria com eles. Que aprendesse a conviver com ele em silêncio, pois se ele reclamasse de novo o poria para fora. Isso causaria um dano à sua imagem como pessoa "ilibada" que era. Que alimentasse os ratos em seu ninho e assim eles ficariam lá sem que ninguém soubesse por mais 500 anos e não fariam "mal maior".
Entenderam?










 

15 março 2016

Atrás da banda só não vai quem?

Pensa um pouco...
Quando jovem saí da Barra para buscar uma oportunidade de vida melhor em São Paulo. O contexto histórico político em janeiro de 1974, quando lá cheguei era de uma ditadura militar instalada muito dura e estava saindo da presidência o Médici entrando o Geisel, em março daquele ano. Fora outros incidentes que participei e presenciei durante esse período, existe um muito marcante em minha vida em que fui abordado pela ROTA, polícia política da época para pegar "subversivos", enfiado dentro de um camburão e enviado a uma delegacia pra prestar depoimento e sem direito que me garantisse a volta pra casa. Tinha 20 anos na época. Essa ditadura tinha se instalado no país em 64 quando, particularmente, minha família passava pela pior situação financeira que passamos. Foi-nos "vendida", ao povo, a ideia de que o país caminhava para o buraco e que era necessária uma intervenção na política. Isso patrocinado pelos EUA e os pelos meios de comunicação da época (Estadão, Globo, Editora Abril, etc..), os mesmos de hoje. Talvez, a maior parte do povo acreditou nisso. Assim, aprendi que uma mentira é tão repetida que você acaba acreditando que seja uma verdade. O tempo me ensinou. Quase cheguei a acreditar, não tivesse vivido em SP na época. E olha que foi com o Geisel, muito mais "doce" que o Médici.
Nas últimas eleições para presidente votei, após ter votado no FHC anteriormente, que se dizia de esquerda e acabou entregando, ou privatizando como eles disseram, o país inteiro, exceto a Petrobras e o Banco do Brasil, nas seguintes pessoas:
* 2002 votei no Ciro Gomes. Tinha Enéas, Garotinho, Roseana, Lula (61,27%) e Serra (38,72%)
* 2006 votei no Cristovam Buarque. Tinha Eloisa Helena, outros, Lula (60,83%) e Alckimin (39,17%)
* 2010 votei na Marina Silva. Tinha outros, Dilma (56,05%) e Serra (43,95%)
* 2014 votei na Luciana Genro. Tinha Marina, outros, Dilma (51,64%) e Aécio (48,36%)
PT não era primeira opção. Acabei por votar nos candidatos do PT no segundo turno como alternativa ao que entendi como coerente aos meus princípios. Não sou PTista, mas preferencialmente voto mais a esquerda, embora já tenha sido incoerente às vezes em meus votos em eleições menores.
Porque eu não fui à manifestação e não a apoio:
- entendo que essa manifestação se originou em oposicionistas, também corruptos suspeitos, envolvidos em processos e até condenados, juntos com Globo, Estadão, Abril, etc.. Os mesmos apoiadores daquela ditadura. Os vendedores de ideias, aquela ideia que ainda permanece em suas vísceras;
- considero uma manifestação política partidária, discriminatória e sectária contra a corrupção somente de alguns. A corrupção dos favoráveis à manifestação não é contestada, questionada, às vezes nem mencionada. Corrupção é corrupção, não tem lado.
Pessoalmente acho que é incontestável o modus operandi da oposição onde detém o poder e pode atuar, a grande interessada na desestabilização do governo eleito. Usa e abusa claramente de atitudes totalitárias, antidemocráticas. Ninguém mexe, ninguém entra. Veja o governo de SP. É a mesma filosofia aplicada em 64 há décadas no trono, mais branda.
Por que considero assim?
- As PMs de SP e PR sob ordens de governos oposicionistas batem em manifestante contrários à sua administração. Apanham estudantes, professores, e  quem ficar à frente por ser contra a posição dos governadores. Parece-me familiar.
- Governo de SP só libera catraca dos meios de transportes públicos para manifestação a favor de seus interesses, deixando de receber dinheiro que não é seu, e não faz isso em outras que são do contra. Isso é governo democrático? Ou abuso de poder?
- Nunca essa oposição deixou a PF invadir a casa de qualquer dos seus aliados quando estavam no poder. Jamais se verá isso.
- Alguém, de família notoriamente oposicionista, cresceu nesse meio, seria tão puro e isento dessa influência como o salvador que imaginam. Cruzando águias nascem pombinhas?
- Em vez de intimação para depor se ordena uma condução coercitiva a um ex-presidente (foda-se a imagem da república) . Qual o propósito disso senão político. O indiciado já havia prestado vários depoimentos por intimação sem faltar a nenhuma. Porque não conduz PMDBistas, PSDBistas, etc.? É juiz ou justiceiro?
- Não revelam ou expõem publicamente os delatados que não sejam contrários aos desejos oposicionistas. Há delações de outros que não do PT, porque não conduzem esses?
- Por suposição de crime (e não que eles não existam) a PF faz invasão de propriedade particular à procura de provas. Isso é subversão dos direitos de qualquer cidadão, acredito. Primeiro condenam, depois provam.
- MPSP decreta prisão preventiva de um ex-presidente da república sem fundamento legal, imaginem o que fariam contra nós, meros mortais.

É certo que possam dizer que esse governo também o faz ou fez. E se sim erra. Enfim, são atitudes que demonstram a forma de agir e revelam como pensam o Direito quando estão no poder. Não estou preocupado com Lula, tem muitos advogados, se vai ser preso, espancado, morto ou seja lá o que for. Estou preocupado com o que isso mostra e o que significa. Estou preocupado com os filhos dos meus filhos. De tudo o que se fala da ruindade do PT, há um aspecto que não se pode questionar, é o de que poderia ter agido com o poder na mão do modo como o outro lado sempre agiu e não fez. Invadindo, prendendo, conduzindo e batendo. Entretanto só tem gente presa de seu lado. O outro é santo. Quanto à roubalheira, há ladrões em todos os níveis e partidos espalhados pelo país todo e sempre houve. Não há qualificação de maior ou menor ladrão. É ladrão e ponto. Deve ser julgado em tribunais imparciais e, se condenado, preso. Tanto petistas quanto outros.

Então, o que representa uma manifestação de gente paulista, branca, com dinheiro pra ir ao restaurante depois? Nada além de uma fração da população inteira, mas paulista, branca, com dinheiro pra ir ao restaurante depois. Contudo já serve. Serve para a Globo se utilizar das imagens para gastar um minuto na abertura de seu Fantástico com os gritos de "fora Dilma" como tanto quer. Já vi esse filme. Março de 1964, manifestação das mulheres paulistas chamada de Marcha da Família com Deus pela Liberdade. Ora bolas, Deus? Liberdade? Sabemos no que deu isso. Mesmo argumento, mesmo jeito de fazer, utilizando da credulidade do povo para subverter a ordem institucional e conseguir o que quer. E todos argumentam com frases formatadas pelos mesmos meios de comunicação de sempre: Globo, Estadão, Editora Abril, Folha, etc.. Ler artigos de jornais isentos do exterior sobre essa operação seria interessante. Não chamarei isso de golpe, pois alguns rebaterão que também é um argumento formatado pelo PT. Mas que é, é. Me serve também. Repito, mesmo filme com novos atores.

Sinto o pêndulo para a direita retornando no mundo. Vejam o que pode acontecer com Trump nos EUA. Crescerá a xenofobia (principalmente com latinos, orientais e africanos) e se acirrará os preconceitos de gênero, de raça, econômico e religioso na maior nação do planeta. Isso não é insignificante, não é pouco.
Na Polônia, um governo autoritário subiu ao poder na eleição do ano passado com uma propaganda parecida. Um garoto foi preso esses dias por postar nas redes sociais um filme em que o chefe de estado rouba uma flor em um túmulo que visitava, no entanto, é porque o filme é rodado invertido no tempo e provoca essa impressão. Mas autoritarismo é autoritarismo. Está preso.

Portanto, tento tomar cuidado com o que escolho, a forma com que escolho e como os conduzo ao poder. Sempre a liberdade e a democracia é a melhor opção. É melhor um governo que erre e você possa processá-lo do que outro em que lhe prendem sem direito a julgamento. É difícil engolir a opinião dos outros contrária à sua, mas é muito melhor do que não poder falar e ouvir. Democracia é um regime duro de engolir, mas é o melhor que se tem. E não me digam que sou PTista, esse argumento não me serve, é encomendado. Sei o que penso e penso assim desde entrei no camburão com um cagaço do cacete de não voltar a ver minha família e namorada.

Não se deixar levar pelo que os outros pensam ou induzem você a pensar é uma virtude. Pensar com seus mais profundos sentidos de unicidade das coisas. Somos uma coisa única, não temos diferença. Somos o que são o mais insignificante ser existente no universo. Somos um elo de corrente. Não se deixar levar pelas circunstâncias, pela perspectiva fechada do olhar de um momento ruim. Abrir o olhar para corrigir o que está errado, trocar a moeda, não para mudar seu lado. Perder a perspectiva desse olhar levou nosso mundo a lugares obscuros mais que uma vez. Resgatá-lo depois é muito mais doloroso. Estamos em uma democracia, não a joguemos fora.